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Participação do clero na fundação do Brasil Império


No Brasil, o episcopado e o clero católico em geral, contribuíram ativa e significativamente para a independência do Reino Unido de Portugal, em 1822. Ademais, os ministros da Igreja, bispos e presbíteros trabalharam intensamente para a "formação do Estado Imperial brasileiro" e, em graus variados, compartilharam muitos dos ideais liberais que marcaram nossa independência, em oposição aos ideais políticos do Antigo Regime.


Frei Francisco de Santa Teresa de Jesus Sampaio (1778-1830), foi o autor do Manifesto do Dia do Fico e um dos articuladores da Independência do Brasil de Portugal. Um liberal e defensor da Monarquia Constitucional era conhecido por seu profundo conhecimento em história, filosofia, teologia e política.


Em 1821, o orador sacro Cônego Januário da Cunha Barbosa (1780-1846) fundou, ao lado de Joaquim Gonçalves Ledo, o Revérbero Constitucional Fluminense, periódico com intuito de defender a causa da independência do Brasil. Ficou marcado na história em episódios importantes dessa época, como o Dia do Fico e a legislatura na Assembleia Nacional Constituinte.


Nas palavras de Thales de Azevedo (1978, p. 122-123): "O novo regime, a nova ordem, a nova estrutura governativa e política instauraram-se sob a inspiração de um confuso amálgama de doutrinas e teorias de que partilhavam não poucos clérigos". Muitos deles não só partilharam teorias políticas comuns, mas também foram artífices de movimentos de ação política.


Quando as cortes de Lisboa se reuniram, em 1820, para exigir que Dom João VI retornasse a Portugal, entre os 89 deputados que o Brasil havia enviado como representantes do reino, 26 eram membros do clero, foram eleitos pelas populações de suas províncias de acordo com os procedimentos adotados pelas próprias cortes. O clero também atuou ativamente na Assembleia Constituinte que redigiu a Constituição de 1824: entre os 100 deputados, 22 eram padres. Esses dois exemplos de envolvimento da Igreja com o processo de independência revelam quanto o clero foi responsável - ao lado de outros intelectuais e lideranças sociais - por defender e divulgar os princípios liberais que marcaram não só os movimentos políticos de emancipação, em Portugal e no Brasil, mas também a primeira Carta Constitucional do Brasil independente.


Sem renunciar à responsabilidade religiosa, os ministros da Igreja demonstraram compromisso com o regime legal e constitucional, e o fizeram pelas vias políticas ordinárias, tais como a adesão a partidos políticos e o exercício de mandatos eletivos de representação política.


Para entender a contribuição da Igreja Católica para a independência do Brasil, precisamos ter presente que o Estado brasileiro, no século XIX, estava em formação; a partir de 1822, tudo estava por se construir, seja do ponto de vista político, institucional, legislativo ou mesmo burocrático. Dioceses, paróquias, confrarias e conventos formavam, talvez, a mais efetiva rede de organização da população, e por isso tais estruturas foram muito bem aproveitadas para a fundação do Estado constitucional.


Os bispos também deram sua contribuição ao processo emancipatório: Três prelados nacionais que participaram da coroação de Dom Pedro I: O Bispo do Rio de Janeiro, Dom José Caetano da Silva Coutinho. Bispo de Mariana, Dom Frei José da Santíssima Trindade, e o Bispo de Kerman, Zenobio Maria de Florença , capuchinho. Nesta cerimônia, uma ausência significativa foi a do Bispo de Salvador, Dom Frei Vicente da Soledade e Castro, o Primaz do Brasil.


Por sua lealdade a Portugal, na época da independência do Brasil, recusou a Coroar no Primeiro Imperador do Brasil Dom Pedro I, “o bispo da Bahia conservou-se fiel ao Rei lusitano, Dom João VI, e, assim, logo após a independência, retornou a Portugal, para não participar de uma situação que ele desaprovava.”Devido à recusa do Primaz em coroar o novo imperador, essa histórica tarefa acabou sendo assumida pelo 6° Bispo do Rio de Janeiro


Dom José Caetano da Silva Coutinho, que como capelão-mor, presidiu o ato da Coroação do primeiro Imperador do Brasil, Dom Pedro I; batizou-lhe ainda os filhos Dona Maria da Glória e Dom Pedro II e assistiu aos últimos momentos da Rainha D. Maria I e a da Imperatriz Dina Leopoldina.


No dia 1º de novembro de 1822, o então Bispo de Mariana, Dom Frei José da Santíssima Trindade, escreveu uma carta pastoral que foi enviada a toda a sua diocese, avisando sobre a coroação imperial que se avizinhava, e também recomendando a seus fiéis que respeitassem a independência brasileira (isto é, que não tomassem o partido dos portugueses), ao mesmo tempo em que também os instruía sobre como proceder com as celebrações.


O bispo do Pará, Dom Romualdo de Souza Coelho (1762-1841), que foi deputado nas cortes de Lisboa, contribuiu para que a província do Pará aceitasse a independência do Brasil, em 1823, depois de alguma resistência. Além disso, os bispos foram peças-chave nas juntas governativas provisórias, muitas das quais - como nas províncias: Pará, Maranhão, Rio de Janeiro, São Paulo e Mato Grosso - presididas por prelados diocesanos


A Coroação do Primeiro Imperador foi marcada pelo sermão de Francisco de Santa Teresa de Jesus Sampaio: “Contava a história do mundo, desde a Grécia antiga até a turbulenta Revolução Francesa, vislumbrando na monarquia o melhor governo, aquele que combate e se contrapõe à anarquia; assim, D. Pedro aparecia como uma solução pacífica e, ao mesmo tempo, encaminhadora da obtenção da liberdade civil e política desejadas.”


Nas vésperas da Independência, o Brasil contava com sete dioceses, cujos bispos eram: D. Vicente da Soledade e Castro – Salvador (BA); D. Joaquim de Nossa Senhora da Nazaré – São Luís (MA); Sede Vacante (sem bispo naquele momento) – Olinda (PE); D. José Caetano da Silva Coutinho – Rio de Janeiro (RJ); D. Romualdo de Souza Coelho – Belém (PA), D. Mateus de Abreu Pereira – São Paulo (SP), D. Frei José da Santíssima Trindade – Mariana (MG) e duas prelazias: D. Francisco Ferreira de Azevedo – Goiás (GO); D. Luís de Castro Pereira – Cuiabá (MT).


Vários bispos que governavam essas dioceses se manifestaram oficialmente em relação à revolução liberal, também conhecida como Regeneração da Nação Portuguesa. O documento utilizado pelos bispos, para expressarem suas posições ao clero e aos fiéis, era a Carta Pastoral. Em pesquisa que venho realizando, encontrei as cartas pastorais de seis deles. Todas apoiavam a revolução e a elaboração de uma constituição, desde que se mantivesse a Igreja Católica unida ao estado, como religião oficial.


As pastorais constitucionais, como eu as nomeei, defendiam uma monarquia constitucional e com câmaras eleitas por voto censitário (ou seja, pelos homens livres, que tivessem uma certa renda anual). Essas cartas não concordavam em tudo.


As pastorais dos bispos do Pará, Maranhão e Bahia, defendiam que o poder central deveria permanecer em Lisboa e resistiam, com suas províncias, contra a Independência do Brasil.


Os bispos do Rio de Janeiro e de Goiás apoiavam não só o constitucionalismo, mas também abertamente a Independência do Brasil. Ambos defendiam a união entre Estado e Igreja, com autonomia dos dois poderes.


Para o bispo do Goiás, em sua pastoral de 4 de agosto de 1822, a população da sua diocese não era obrigada a ficar fiel a um juramento dado às Cortes de Lisboa, que lhes traria dano e ruína. O povo de Goiás deveria, portanto, pegar de volta o poder que Deus lhes deu e dá-lo a um novo representante. Segundo o bispo, o poder dado aos reis “é mediante ‘Populo’ em que reside o poder para comunicar aos Reis; que só um povo livre o pode dar, escolhendo o Rei, como primeiro Magistrado da Nação para o fazer executar”. E o povo, agora, deveria jurar e comunicar esse poder a D. Pedro.


O bispo do Rio de Janeiro sempre esteve ao lado de D. Pedro, abençoando todos os seus atos no caminho que acabou levando a Independência do Brasil, por isso escreveu a seus fiéis, na sua pastoral de 30 de junho de 1822: “A MÃO do Omnipotente, que no ano de 1808 trouxera o Senhor Rei Dom João VI ao Brasil para abrir os seus portos fechados ao comércio das Nações, para o levantar do estado abjecto de Colônia, em que jazia, para o colocar na sublime categoria de Reino a par dos povos livres e civilizados da Europa e da América; esta Mão sempre constante e generosa é a mesma, que agora, no ano de 1822, retém o Príncipe Regente no Brasil para ultimar o ato da sua emancipação e coroar a grande obra da sua felicidade”. A Providência, a Mão de Deus, a Vontade Divina, estava traçando o caminho da Independência, no qual, na opinião do bispo, a família real teria papel central.


A Providência, a Mão de Deus, a Vontade Divina, estava traçando o caminho da Independência, no qual, na opinião do bispo, a família real teria papel central.


Os bispos no Brasil fizeram uma leitura política a partir do contexto das regiões nas quais viviam e pastoreavam. Abraçaram a revolução, o constitucionalismo e posteriormente quase todos aderiram à Independência do Brasil, com exceção de dois, o arcebispo da Bahia, que continuou fiel o governo liberal de Lisboa e o bispo do Maranhão, que, após voltar a Portugal, aderiu ao movimento antirrevolucionário. Em um balanço geral, a Igreja no Brasil aderiu sinceramente ao constitucionalismo.


A atuação do clero nos assuntos de Estado era facilitada pelo regime de padroado civil da Igreja, os bispos e os padres faziam parte da administração pública e compunham os quadros do funcionalismo do Estado, como servidores de carreira: Frei Leandro do Sacramento recebera em 1823 uma importante promoção, oferecida pelo próprio imperador do Brasil, D. Pedro I, o qual nomeara como primeiro diretor do Jardim Botânico da Lagoa de Rodrigo de Freitas.


Frei Antônio de Arrábida (1771-1850), o Bispo de Anemúria, foi um padre franciscano, botânico e professor português, tutor do futuro Imperador Dom Pedro I do Brasil e do Rei Dom Miguel de Portugal, foi primeiro chefe da Biblioteca Imperial e Pública da Corte (Atual Biblioteca Nacional) e o primeiro reitor do Colégio Pedro II, era considerado um dos homens mais cultos de sua época.


O papel das "assembleias paroquiais" foi reproposto pela Constituição de 1824, que designou as paróquias como zonas eleitorais também para a escolha de representantes políticos em âmbitos provincial e nacional. Para o Brasil do século XIX, as igrejas paroquiais, com seus templos e liturgias festivas, eram os principais espaços de sociabilidade da população e forneciam eficazes estruturas de organização cívica; justamente por isso, podiam servir como espaços políticos incontornáveis para o Brasil independente.


Fonte: OS BISPOS E A REVOLUÇÃO


A Revolução do Porto sacudiu o império português e exigiu dos bispos no Brasil um posicionamento frente ao constitucionalismo e a independência. Ítalo Domingos Santirocchi

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