Fé e Razão, sobre a transmissão da fé a gerações futuras
- Ação Orleanista
- 20 de dez. de 2022
- 6 min de leitura
Atualizado: 26 de abr.
Por Otavio Lélio de Jesus da Silva, membro do Núcleo Estadual do Espirito Santo

Há uma superstição moderna de natureza secular, de que a fé é contraria a razão, e dessa forma toda a pratica que a cerca é pura e simplesmente sustentada pela emoção. Infelizmente não é claro o entendimento de que essa ideia é um grande e infeliz equívoco, muito enfatizado pelo relativismo promovido pelas suscetíveis revoluções desde Lucífer com seu intuito de mudar a organicidade das coisas promovida pelo próprio Deus, passando por Lutero com o protestantismo, a revolução liberal Francesa, posteriormente a socialista na Rússia e depois o estado laico na revolução Americana, e outras que continuam ocorrendo nos dias atuais.
Entretanto podemos definir de forma enfática que a dissolução do relacionamento que a fé e a razão tinham, deu com o pecado original de Adão e Eva. É possível notar que Adão detinha um conhecimento natural das coisas, tanto que foi o responsável por promover a nomenclatura da criação terrena de Deus. Adão também possuía uma amizade com o criador, era tão intimo de Deus que o contemplava face a face, podendo concluir assim que Adão também detinha o conhecimento espiritual, sendo dessa forma o primeiro pontífice, pois conseguia centralizar em si as duas instituições, a espada temporal e atemporal.
Após a falha da desobediência a Deus, esses entendimentos se perderam, retornando séculos depois na linhagem de Noé, onde o mesmo por advento de uma benção a seus filhos Sem e Jafé, profetizou que dos povos descendentes dos dois, viria o resgate do conhecimento espiritual e natural. Da linhagem de Sem veio o povo Hebreu e consequentemente o povo Judeu, o qual promoveu da linhagem de Davi, a profecia do messias e a revelação que é Cristo.
E da linhagem de Jafé veio a formação dos povos Jafesitas Indo-europeus, habitantes também do Cáucaso, promovendo assim o povo Jônio, o principal formador dos povos helênicos, que viriam a fundar a magna Grécia e posterior mente a filosofia. Se caminharmos na história da filosofia, da era clássica até o nascimento de Cristo, é possível ver princípios da revelação funcionando como um auxilio a profecia. Ensinamentos de Heráclito com o “Logos”, Sócrates com o entendimento da alma, Parmênides com o “Uno”, e a celebre frase de Cicero: “Causa das causas, tenha misericórdia de mim”, três anos antes de Cristo nascer, citação essa que serviu de grande influência para Santo Agostinho.
Isso mostra que o retorno do relacionamento da fé e da razão se deu no corpo místico de Cristo que é a Santa Igreja Católica Apostólica Romana. Onde essa que é a instituição mais antiga e que a mais tempo se mantem em atividade, até os dias atuais, pois tem a garantia de seu criador:
“Ensinando-os a guardar todas as coisas que eu vos tenho mandado; e eis que eu estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos. Amém.” (Jesus Cristo – Livro de São Mateus 28:20)
Promoveu a fundação de escolas, universidades, a invenção do rádio, ramos de estudo como a genética, a teoria do Big bang, e a própria síntese do método cientifico, devido as quatro causas aristotélicas que só foi possível devido a abordagem metafisica do próprio:
“Assim, desse princípio dependem o céu e a natureza. E seu modo de viver é o mais excelente: um modo de viver que só nos é concedido por um breve tempo. Mas ele permanece sempre nesse estado. Para nós, é impossível, mas para ele não é impossível, pois o ato do seu viver é prazer. Para nós, vigília, sensação e conhecimento também são agradáveis em grau supremo exatamente porque são ato; assim também, em virtude deles, esperanças e lembranças. [...] Se, portanto, Deus se encontra perenemente nessa feliz condição em que nos encontramos as vezes, isso é maravilhoso. Se ele se encontra em uma condição superior, é ainda mais maravilhoso. Se ele encontra de fato nessa condição, ele é de fato vida, pois a atividade da inteligência é vida, e ele é precisamente esta atividade. Essa atividade, que subsiste de per si, é vida ótima e eterna; desse modo, pertence a Deus uma vida perenemente contínua e eterna; isto é, portanto, Deus” (Metafisica – Aristóteles)
Nota-se um certo anseio que a razão tem de se firmar pela fé, como se a sua existência e atividade só é plena quando ela mesma está alinhada a busca da verdade:
“A alma, então, quando purificada, torna-se uma forma e um princípio expresso, e inteiramente incorpóreo e intelectual e totalmente divino, que é a fonte da beleza e de todas as coisas que têm afinidade com ela. A alma então, sendo conduzida ao Intelecto, torna-se ainda mais bela. E o intelecto e as coisas que vêm do intelecto são a beleza da alma, porque lhe pertencem, isto é, não lhe são alheios, porque então é realmente só alma. Por isso, diz-se com razão que, o bem e o ato de ser belo para a alma consistem em “ser assimilado a Deus” porque é aí que se encontra a beleza e o resto do destino dos seres reais. Ou melhor, o verdadeiro ser é a beleza personificada e a feiura é a outra natureza, o próprio mal primário, de modo que, para Deus, “bom” e “belo” são a mesma coisa, ou melhor, bondade e beleza são a mesma coisa”. (Enéadas - Plotino)
Assim como o casamento é uma instituição onde duas pessoas distintas, que conseguem viver separadamente, mas juntas são algo maior, fé e razão se complementam, e essa visão serve de embasamento para o estado confessional, onde esse tem o nobre objetivo que é a salvação das almas:
"Há um entrelaçamento mútuo de todas as coisas, e sua união é sagrada, sendo que entre elas não existe quase nenhuma que seja estranha a outra. Com efeito, foram dispostas em conjunto e contribuem em conjunto em favor do mesmo mundo. Existe, com efeito, um só mundo ordenado que abrange tudo, uma só Divindade que abrange tudo, uma única substância, uma só lei, uma só razão comum a todos os seres vivos de gênero idêntico contam como uma única perfeição e participam de uma mesma razão." (Marco Aurélio)
Dessa forma, principalmente nos dias atuais, em que a metafisica é criticada negativamente assim como a fé, e o racionalismo e o cientificismo é cegamente defendido, para que aja a defesa da Santa Igreja contra a doutrina demoníaca, é necessário ainda mais a utilização da razão. É necessário preparar as gerações seguintes, que nasceram e cresceram e estão inseridos nesse mundo secular, para defender a sua crença. E como os inimigos da Igreja não compreendem esse santo ideal, devemos nos preparar para esses possíveis combates no campo das ideias, em casa com uma boa educação, e na catequese, principalmente no período de confirmação da fé que é a crisma.
Infelizmente Deus não se mostra de forma clara. E essa condição é a causa da dúvida de seu ser para os que não conseguem ver que Ele é. Quem escolhe uma fé, por advento puro e simples das emoções e paixões e exclui a razão, encontra-se em igual erro a quem escolheu não ter fé alguma por mau uso da própria razão. A fé é um mistério que pode ser praticado, sendo dessa forma um ato. Pode ser de nossa posse, mas não é nossa, é entregue a nós por misericórdia, como uma outorga que temos a obrigação de mantê-la, como algo que será cobrado posteriormente. A fé é uma certeza não evidente, que pode ser explicada como sendo uma força de vontade, e por isso deve ser confirmada pela razão.
A fé como dom sobrenatural, portanto não possível ao homem por meios próprios, sendo assim promovida por misericórdia divina, onde os homens comunicam-se com Deus por através das orações. O homem utiliza-se da razão, não sendo essa capaz de entender a fé, pois aquela vibra em uma frequência superior, e por não a entender muitas vezes a revoga. Diferentemente de nós, os anjos intuem já diretamente da essência das coisas, pois o conhecimento angélico dispensa o esquema gradativo da lógica. A fé é neste sentido o meio pelo qual o homem se comunica com Deus, consequentemente mostrando o total amor de Deus por nós, pois sendo sumamente bom não pode fazer outra coisa que não se comunicar.
Essa condição intuitiva dos anjos ocorre devido à ausência das almas vegetativa e instintiva, que devido à ausência não impede a progressão da alma intelectiva. Podemos assim concluir que a principal diferença dos anjos para conosco é que possuímos essas travas que por antonomásia são empecilhos para a progressão do intelecto. Contudo nós humanos, só lidamos com a fé pela razão, pois a razão é o único meio que temos para compreender de fato a realidade. Somos seres racionais e só compreendemos racionalmente. Más é óbvio que a fé clarifica a razão naquelas coisas que a razão por si mesma não pode alcançar.